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Quinta-feira, Março 28, 2024

Jerusalém edificada como cidade inabalável_Parte 3

Belém é outra cidade governada pelos palestinianos, próxima de Jerusalém. Ficámos alojados na magnífica “Casa Nova” dos franciscanos, mesmo colada ao complexo da Basílica da Natividade. Celebrámos a Eucaristia numa das diversas capelas subterrâneas (gruta) deste complexo, num ambiente completamente extraordinário. Passeámos pela praça central da cidade, aqui junto, mergulhámos num bairro árabe, super seguro, para uma extensa conversa com um árabe, em que percebemos um pouco melhor do xadrez político e administrativo destas cidades ocupadas, onde vive um povo sem terra, e onde reina a paz por acordos, que são respeitados, mas onde sentimos que as pessoas, as comunidades não comungam o mesmo sentir, e estão contidas à força: do lado de cá (árabe, que também é Israel) e do lado de lá, Israel. A maior parte da população árabe de Belém era cristã, mas quase todos emigraram.

O guia árabe que tínhamos nesta cidade, simpático e afectuoso, era católico. Apontou para a cidade que se via ao longe no cimo do outro monte (Jerusalém) e disse: “É mais difícil chegar acolá do que chegar a Portugal”. O controlo entre a zona árabe e Israel é muito rigoroso. Cerca de 2 milhões de árabes das zonas ocupadas trabalham em Israel e para chegar ao emprego, eles vivem diariamente um verdadeiro calvário. No dia seguinte, perguntei à guia israelita, em Jerusalém:

– Faz sentido hoje, com a convivência e a paz entre os palestinianos e Israel, construírem o muro à volta de Jerusalém? Ao que ela me respondeu: – “Não tivemos outra hipótese. No ano 2000, o número de mortos por atentados, em Jerusalém, foi de 18 pessoas em média por dia (6.570 num ano). Vivíamos todos os dias, 24 horas por dia, num pânico total. Nunca sabíamos se voltávamos a casa ao fim do dia. Depois da construção do muro, acabaram por completo os atentados. Os árabes da Fatah dizem que a sua administração é corrupta, e não podem ouvir falar nos outros palestinianos que estão em guerra na Facha de Gaza (Hamas).”

As igrejas do complexo da Natividade são de diversas confissões cristãs, o local indicado como o do nascimento de Jesus, está na igreja ortodoxa. Esta confissão domina muitos dos locais sagrados. São igrejas ricas de arte iconográfica, mas muito estranhas para nós. Muitos turíbulos pendurados em todo o lado, e com a utilização de incensos; as igrejas no geral estão completamente negras do fumo… Foi uma constante.

Visitámos o local indicado como o do nascimento de Jesus, fizemos a adoração que é da praxe naquele lugar, e uma pequena oração no fundo da pequena sala. E ainda a partir de Belém, fizemos uma primeira incursão na belíssima cidade de Jerusalém.

Neste dia, e nos seguintes, visitámos todos os lugares santos, os turísticos e mergulhámos na história desta fantástica cidade. “Jerusalém edificada como cidade inabalável”. Passou por muitas vicissitudes, e por três grandes destruições. Todas elas foram deixando marcas para a história, e podemos encontrar vestígios desde tempos imemoriais. Por exemplo, o “Jardim das Oliveiras”, tem mesmo árvores do tempo de Jesus, cuja idade foi calculada cientificamente pelo método de carbono 14. Aqui, no Getsemani, celebrámos a Eucaristia numa gruta subterrânea, mais uma vez, num ambiente absolutamente fantástico e privilegiado. Calcorreámos todos os lugares: o local da visita de Nossa Senhora à sua prima Isabel, o Jardim das Oliveiras, o sítio onde Jesus ensinou a rezar (o Pai Nosso), o sítio onde ainda permanece a pedra onde Ele chorou e pediu ao Pai que “se for possível, afasta de Mim este cálice” (dentro de uma maravilhosa igreja católica), percorremos todo o percurso da Via Sacra, a terminar num local dos mais memoráveis, a zona do Calvário e do Santo Sepulcro. É um complexo único enorme, que alberga igrejas de muitas confissões cristãs, das quais se destacam as ortodoxas (o Calvário e o Sepulcro, logo ao lado), mas junto e com porta para a mesma cúpula do Sepulcro, está a igreja franciscana, onde terminámos o dia, e a nossa Peregrinação, com a celebração da Eucaristia, ali mesmo.

Nesta cidade visitámos muitos outros pontos fantásticos, sobretudo dentro das muralhas (cidade velha). Fomos a sinagogas, visitámos o museu de Israel, junto do qual está uma monumental maquete da cidade de Jerusalém do tempo dos romanos; fomos ao Muro das Lamentações e à grande sinagoga anexa, passeámos no bairro árabe, no bairro judeu, no bairro cristão, visitámos o Cenáculo e a casa onde nasceu Maria (dentro da igreja de Santa Ana, com uma acústica fabulosa), enfim, cansados, mas felizes.

De facto, o sentimento é de que, Jerusalém é muito mais do que uma cidade física. É um local de encontro de todas as civilizações, de todas as ideologias, a verdadeira torre de babel bíblica. As sucessivas destruições de Jerusalém, não a destruíram, tornaram-na sempre maior. É um lugar sagrado, mítico, direi até, tolerante, mesmo que nele convivam extremos de toda a ordem. Jerusalém é muito mais do que a cidade física, imemorial e supermoderna na actualidade. É uma âncora de sentires e de afectos de muitos milhões de pessoas, que já lá foram e que não foram.

A Jerusalém, deve ir-se sempre como peregrino, independentemente de se receber ou não o certificado dessa qualidade (nós recebemos).

A nossa viagem, não foi uma viagem qualquer; foi uma verdadeira peregrinação, cheia de expectativas, a maior parte delas, muito ultrapassadas pelo que vivemos e sentimos. Imaginam que passamos uma tarde em filas e afins para, por exemplo, visitar o calvário e o túmulo de Cristo e, no fim do dia, tivemos o privilégio de celebrar uma Eucaristia ali mesmo? Isso aconteceu em diversos locais. Quando puder… lá voltarei.

Luís Matias, ASDL

Ver fotos em facebook.com/uaaasp

5 thoughts on “Jerusalém edificada como cidade inabalável_Parte 3

  1. Excelente narrativa que agradeço, Luís Matias; reflete o que penso e ficou de uma peregrinação que fiz a Jerusalém há alguns anos, estamos sintonizados.

  2. Excelente, Luís Matias! O que escreves sobre a história de Jerusalém bate certo com a narrativa do livro JERUSALÉM, de Simon Sebag Montefiore. Tenho-o entre mãos mas só li ainda uma parte.

  3. Desde que iniciei a leitura da maravilhosa crónica escrita pelo Luís Matias “entrei”, também, na peregrinação dos nossos amigos e companheiros da UASP! E recordei com saudade e profunda emoção espiritual os anos de 2000, 2007, 2010 e 2016, quando integrado em peregrinações franciscanas conheci os lugares santos onde a Palavra de Deus foi revelada.
    Em Caná da Galileia tive o privilégio de renovar o Sacramento do Matrimónio, celebrando as bodas de ouro, com a bênção especial do Papa Francisco.
    Felizes os que vivem a experiência das peregrinações à Terra Santa, porque ficam para sempre gravadas nos seus corações como uma experiência transformadora.
    Abraço amigo e fraterno
    Alfredo

  4. Já tive oportunidade de, com o Padre José Alves – Porto de Mós, fazer esta viagem. A descrição do Luis Matias está muito boa e, no fundo, o sentimento com que fiquei foi o mesmo que o Luis descreveu.

  5. Obrigado, Luís Matias, pelos pormenores da descrição, recordando eu a viagem que fiz há anos. foi mais geral. o nosso guia era judeu, não ortodoxo. Falava com paixão e quase melhor que um católico. Perguntei-lhe por que não és católico ? Ele disse que sua família era judia…

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